Sub silentio

terça-feira, junho 19, 2012

Apaguei o teu número do meu telemóvel. Não vou precisar mais dele.
Fomos amigos desde que eu nasci, pois eu sou mais nova 2 anos. Fomos inseparáveis durante uns 15 ou 16 anos e depois sempre que ía à Covilhã encontrava-te, por uma razão ou por nenhuma, e punhamos a conversa em dia, nem que fosse só de passagem. Nem que fosse um: "Então, oh prima, como é que isso vai?" Típica frase tua!
Vivemos lado a lado e até tinhamos toques secretos na parede do quarto para saber qual era a melhor altura para irmos brincar. Saltavamos o muro que dividia os nossos quintais e a diversão começava!
Ensinaste-me imensa coisa: a jogar futebol, Sega Mega Drive e antes disso só tu tinhas a Spectrum! Ensinaste-me a perder no Subuteo e no monopólio (acho que fazias batota). Tinhamos o nosso gang e acabavamos o dia cheios de medo que os maus aparecessem!
A primeira mota que guiei sozinha foi a tua DT! Aprendi aí como funcionava uma embraiagem! Nunca mais me livrei deste gosto por motas!
As campainhas que tocamos, as Janeiras, a casa (que nunca conseguimos fazer) no teu limoeiro, o vizinho do quintal de baixo!!! Aprendi a esconder-me dos vizinhos maus que esfaquearam a nossa bola!
Estavamos sempre de acordo. Discordavamos, mas sempre convenvciamos o outro e acabavamos por concordar. Ensinaste-me o que era ser Bom, Amigo e flexível.
Eras o meu primo que toda a gente conhecia e adorava! Toda a gente queria ir às tuas festas de anos! Eram as melhores e acabavam, pelo menos para mim, já de madrugada!
Os vidros da Escola que foram atingidos pela nossa carabina! Apercebi-me das leis da física quando atirei a primeira vez do quintal!! As guerras com aquelas metralhadoras feitas de tubos. E havia dias mais calmos em que destruíamos os quartos e construiamos casas, fortes e faziamos "papinhas" com tudo o que havia no jardim! Uma vez, um dos nossos cocktails até compressas tinha.
Os amigos assim são difíceis de encontrar e de manter, mas tu sabias que eu não era muito boa na questão do "manter". Mesmo assim, era sempre igual: havia sempre alguma coisa para dizer ou ver. É impossível substituir um amigo assim, que me conhece desde sempre e que eu pensava que seria para sempre.
Nunca se pensa que a vida pode acabar de um momento para o outro e, como eu li, "nunca estamos preparados para a morte". 
Aqui, as notícias chegam tarde, ou nem sequer chegam a chegar! Sabia que estavas doente e tentei falar contigo, mas nunca me apercebi da velocidade do que te devorava e do quanto te massacrava. Sinto uma tristeza profunda e também raiva, por não ter falado contigo antes, mas não há nada que possa fazer. A morte que escolheste é definitiva, corajosa e impotente. Ou melhor, torna-me impotente pois não consegui evitar e muito menos alguma coisa consigo alterar.


Foste o meu grande amigo e sei que nunca mais vou conhecer tão alguém bem, nem ninguém vai saber tanto de mim como tu. Nunca vou ter segurança para confiar totalmente em alguém, como confiava em ti. Beijinhos meu primo